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Carta “Unitas in Diversitate” - Dicastério para os Bispos

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DOM DIMITRI PICCOLOMINI CARDEAL ABRAMOV

POR MERCÊ DE DEUS E DA SANTA SÉ APOSTÓLICA

PREFEITO DO DICASTÉRIO PARA OS BISPOS


Carta aos bispos:

“Unitas in Diversitate”

(Unidade na Diversidade)


Em nome da graça e da paz que provêm de Nosso Senhor Jesus Cristo e com alegria e reverência, saúdo os Vossos Excelentíssimos Reverendíssimos Arcebispos, Bispos Auxiliares e Eméritos, assim como todo o amado povo de Deus que peregrina sob o manto da Santa Mãe Igreja.


Com afeto fraterno em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, o Bom Pastor que nos conduz à unidade e nos reúne em comunhão, é com profunda alegria e humildade que dirigimos esta carta a todos os estimados bispos espalhados pelos confins do mundo. Sob a orientação e inspiração do Espírito Santo, almejam adentrar em uma reflexão significativa sobre o tema primordial da unidade na diversidade, uma realidade vital à vida e ao propósito missional da Santa Igreja de Cristo.

Desde os primórdios da Igreja, a riqueza e a variedade de seus membros têm sido uma constante. Inspirados pelas palavras do Novo Testamento que nos recordam que, apesar de sermos numerosos, formamos um único corpo em Cristo (1 Coríntios 12, 12-13), somos impulsionados a compreender essa diversidade como uma manifestação tangível da sabedoria divina. De fato, essa unidade na diversidade reflete de maneira ímpar a própria Trindade, onde há uma comunhão perfeita entre as pessoas divinas, apesar de suas distintas e complementares naturezas. Assim como o Pai, o Filho e o Espírito Santo coexistem em uma perfeita harmonia, nós, como membros do Corpo Místico de Cristo, somos chamados a celebrar e valorizar as diversas dons e talentos que cada um traz consigo.

Entretanto, é crucial reconhecer que, embora a diversidade seja uma fonte de enriquecimento e vitalidade para a nossa comunidade de fé, ela também pode, em certos momentos, representar um desafio para a nossa unidade. Como pastores do rebanho de Cristo, incumbidos da tarefa sagrada de zelar pela unidade da Igreja (Efésios 4, 3), somos convocados a desempenhar um papel ativo como guardiões dessa unidade. Em um mundo marcado por divisões e polarizações, é nossa responsabilidade promover uma comunhão genuína entre todos os membros do Corpo de Cristo, independentemente de suas origens, culturas ou convicções. Essa é uma missão sublime e desafiadora, que requer não apenas sabedoria e discernimento, mas também uma profunda compreensão da riqueza e complexidade da diversidade humana.

Nesse sentido, é crucial recordarmos que a diversidade não é apenas uma realidade a ser tolerada, mas sim um presente divino que enriquece a vida e a missão da Igreja. Nos escritos de Paulo, encontramos preciosas lições sobre a diversidade dentro do corpo de Cristo, onde cada membro desempenha um papel único e essencial na edificação e no fortalecimento mútuo da comunidade (1 Coríntios 12, 14-27). Assim como os diferentes membros do corpo humano têm funções distintas, mas complementares, cada indivíduo dentro da Igreja contribui de maneira singular para a plenitude do Corpo de Cristo. Portanto, é imperativo que acolhamos essa diversidade com um coração grato e humilde, reconhecendo-a como uma expressão da infinita sabedoria e graça de Deus que se manifestam em nossas vidas e em nossas comunidades. Ao invés de encará-la como uma fonte de divisão ou discordância, devemos abraçá-la como um testemunho da beleza da criação divina, que nos convida a celebrar a riqueza das diferentes experiências, perspectivas e dons que cada um traz consigo.

No entanto, é imperativo que estejamos conscientes dos desafios inerentes à diversidade. Em uma era marcada pela polarização e pelo conflito, é compreensível a tentação de nos fecharmos em nossas bolhas individuais, agarrando-nos às nossas perspectivas e tradições como um refúgio contra a incerteza e o desconhecido. Contudo, como discípulos de Cristo, somos convocados a transcender essas barreiras autoimpostas, capacitados pela graça divina a construir pontes de entendimento e solidariedade entre diferentes grupos e culturas. Em vez de permitir que as diferenças nos dividam, somos desafiados a transformar essas diferenças em oportunidades de enriquecimento mútuo e crescimento espiritual. Neste mundo fragmentado, somos chamados a ser agentes de reconciliação e construtores de paz, seguindo o exemplo daquele que veio para reunir o que estava disperso (João 11, 52), proclamando a todos a boa nova da reconciliação em Cristo (2 Coríntios 5, 19).

Para promover a unidade na diversidade, é essencial que nos comprometemos fervorosamente com o diálogo fraterno e respeitoso, onde cada voz seja não apenas ouvida, mas verdadeiramente valorizada. Essa abordagem encontra respaldo nas sábias palavras de São Tiago, que nos exorta a sermos rápidos para ouvir, ponderados para falar e serenos para nos irritar (Tiago 1, 19). Essa postura, embora exigente, é fundamental para o estabelecimento de laços genuínos de entendimento mútuo e cooperação. Somente por meio de um diálogo paciente e uma escuta atenta podemos transcender as barreiras que nos separam, permitindo-nos mergulhar nas profundezas da experiência do outro e enriquecer nossa própria compreensão da realidade. É nesse espaço de abertura e receptividade que encontramos as bases para construir pontes sólidas de amizade e colaboração, capazes de unir corações e mentes em busca de um bem comum maior.

Além disso, é imperativo que cultivemos e fomentemos ativamente uma cultura de acolhimento e inclusão em nossas comunidades eclesiais, onde cada indivíduo se sinta genuinamente acolhido, respeitado e valorizado. Isso vai muito além de meras palavras ou gestos superficiais; implica, antes de tudo, um profundo compromisso em estar atento às necessidades e preocupações dos mais vulneráveis entre nós. Devemos ser sensíveis às vozes silenciadas, aos que sofrem em silêncio, e agir com compaixão, misericórdia e justiça em sua defesa. Tal atitude não é apenas um sinal de nossa humanidade compartilhada, mas também uma expressão tangível de nossa fé em ação, conforme nos recorda o Salmo 133: "É bom e agradável quando os irmãos vivem em união", revelando assim a plenitude da bênção divina que emana da unidade fraterna e solidária.

Como bispos, somos investidos com a responsabilidade singular de guiar nossas comunidades no percurso da unidade na diversidade. Esta tarefa não apenas requer uma profunda compreensão das necessidades e aspirações dos fieis e clérigos, mas também exige que sejamos modelos vivos de humildade e serviço, seguindo o exemplo de Cristo, o Bom Pastor, que veio não para ser servido, mas para servir (Marcos 10, 45). É através desse serviço desinteressado que podemos verdadeiramente buscar o bem-estar de todos os membros da nossa comunidade, particularmente daqueles que se encontram à margem ou são excluídos pelos padrões da sociedade.


Portanto, convidamos cada um de vocês, irmãos bispos, a ampliar as fronteiras do nosso entendimento e a transcendê-las para além das nossas próprias tradições. Neste espírito de abertura e acolhimento, somos convocados a construir pontes de entendimento e colaboração com aqueles que têm perspectivas e vivências diferentes das nossas. Reconhecemos que, em um mundo marcado pela polarização e divisão, somente unidos como membros do Corpo de Cristo, podemos testemunhar ao mundo o poder redentor e transformador do amor de Deus que nos une em uma só família. Afinal, como Jesus orou em João 17, 21, "Que todos sejam um, como Tu, Pai, estás em Mim e Eu em Ti."

Que o Espírito Santo, esse maravilhoso elo de amor que une o Pai e o Filho numa relação eterna e indissolúvel, derrame abundantemente sobre nós a graça necessária para cultivar e fortalecer a unidade na diversidade dentro de nossas comunidades e em toda a Igreja. Que Ele, como o sopro divino que anima nossos corações e mentes, nos capacite e inspire em nossa nobre missão de sermos fieis testemunhas do Evangelho em meio a um mundo marcado pela divisão e desunião. Que, com a luz do Espírito Santo, possamos irradiar o amor e a misericórdia de Deus, atraindo a todos para a fonte inesgotável de graça e redenção. Que nossa união na diversidade seja um sinal luminoso do Reino de Deus, onde todas as diferenças são acolhidas e celebradas como expressões únicas da infinita criatividade divina. Que todos aqueles que nos observam possam ser tocados e transformados pelo amor de Deus que habita em nossos corações, levando-os a crer no poder e na bondade do Senhor que nos reúne como uma família de fé. Que assim seja, conforme a vontade divina e para a glória de Seu Santo Nome.

Dado em Roma, na sede deste Dicastério,

no dia 11 de Abril,

do ano do Senhor de 2024,

sob o reinado de João II.


+ Dimitri Piccolomini Card. Abramov

Prefeito do Dicastério